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terça-feira, 26, novembro, 2024

Paciente diz que foi operada por técnica de enfermagem no hospital de Bolívar: ‘Era tratada como médica lá e nas redes sociais’

Kellen Queiroz em foto postada em suas redes sociais: rotina de médica, diploma de técnica — Foto: Reprodução/Redes sociais

O caso de uma paciente que denunciou que era mantida em cárcere privado no Hospital Santa Branca, de propriedade do cirurgião Bolívar Guerrero da Silva – preso pela denúncia –, trouxe outras denúncias de irregularidades à tona.

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Uma delas é da vendedora Fernanda Almeida, de 24 anos. Ela se diz vítima de erro médico e que descobriu depois que a “médica” que fez o procedimento nela era, na verdade, a técnica de enfermagem Kellen Cristina de Queiroz dos Santos, de 31 anos.

“Para mim, a Kellen era médica. Tanto que tratei minhas cirurgias com ela. Ela, inclusive, cobrava a mais para estar na cirurgia. Dizia que o doutor Bolívar era muito ocupado e não conseguia dar tanta atenção depois, no pós-operatório. Mas que, se a paciente topasse pagar a mais, ela daria toda assistência no pré-operatório, durante e nos pós”, contou.

Fernanda se submeteu a uma cirurgia de colocação de silicone, em janeiro de 2021, e a um retoque, em agosto do mesmo ano.

Prints das conversas entre Fernanda e Kellen: assistência total e atestado — Foto: Reprodução

Fernanda conta que Kellen oferecia/vendia as cirurgias, mas sempre se apresentava como médica, usava jaleco branco no hospital e era tratada como tal no Santa Branca.

Com a promessa de que receberia todo suporte e atenção na sua cirurgia, Fernanda aceitou pagar a mais para Kellen. O procedimento de janeiro, que custaria R$ 7 mil só com Bolívar Guerrero, foi para R$ 8,1 mil para ter a ajuda e assistência de Kellen Queiroz.

Como mostram prints apresentados por Fernanda (veja acima), nas tratativas para o procedimento, Kellen detalha como cuida das pacientes e oferece inclusive um atestado para Fernanda para que ela consiga ser liberada do trabalho.

O g1 tentou contato nos telefones de Kellen, mas não conseguiu falar com a técnica de enfermagem. Em depoimento à polícia, ela disse atuar apenas como “suporte técnico” e na captação de pacientes.

Questionada se tem ciência das denúncias de que Kellen opera as pacientes, a polícia disse apenas que o caso está em fase de investigação.

Cirurgia supostamente com Kellen

Ainda segundo o relato, após a primeira cirurgia, ao perceber que o resultado não tinha ficado como esperava, Fernanda recorre a Kellen, que prontamente responde que os inchaços no local operado podem alterar a forma do seio e marca um revisão.

“Vem, minha linda, pra eu te ver. Você está causando com esses seios. Muita gente me ligando e querendo um igual. Estão babando no seu seio. Vamos benzer”, diz print da conversa entre Kellen e Fernanda e que também fazem parte do processo que a ex-paciente move contra a técnica de enfermagem e Bolívar Guerrero.

Print das conversas de Fernanda e Kellen: orientações e elogios — Foto: Reprodução

Em fevereiro, quase um mês depois da cirurgia, Fernanda pede ajuda com as cicatrizes e recebe a indicação de uma pomada de Kellen.

Ela também voltou ao que diz ser o consultório da técnica de enfermagem para mais uma revisão e, ao não se satisfazer com o resultado da primeira cirurgia, que teria deixado os seios tortos e caídos, pede um retoque.

O mesmo foi marcado para agosto de 2021 e, novamente Fernanda pagou a mais novamente para ter o suporte de Kellen.

“No primeiro procedimento, levei anestesia geral e apaguei. Mas, na segunda, tenho certeza que foi ela que me operou. Eu ouvia a voz dela na sala de cirurgia, fazendo as coisas. No segundo procedimento, só vi o doutor Bolívar na hora que ele saiu de um outro centro cirúrgico, com as luvas ainda sujas de sangue e veio marcar o meu peito. Quando fiz uma cara de nojo, ele tirou uma das luvas e jogou fora. Marcou o peito e foi embora”, diz Fernanda.

Ela conta que, além de não ter tido Bolívar em seu procedimento, foi destratada por uma anestesista que disse: “Essa aí está gostando de fazer cirurgia”, e não recebeu o mesmo suporte da então “dr. Kellen”.

Print da conversa entre Fernanda e Kellen: indicação de medicamento e consultório — Foto: Reprodução

O resultado da segunda cirurgia não melhorou a situação. Os seios foram levantados, mas ficaram com auréolas diferentes e um peito mais para cima do que o outro.

Kellen também não apareceu para tirar o dreno, como havia tratado com sua “paciente”, segundo Fernanda.

Print de conversa entre Fernanda e Kellen: paciente? — Foto: Reprodução

Processo por erro médico e dano moral

Fernanda conta que, ao ficar insatisfeita com o resultado das duas cirurgias, passar quase o ano de 2021 com problemas nos pontos dos seios – que abriam e minavam um líquido – , e ser dispensada por Kellen, resolveu processar a técnica de enfermagem e Bolívar. O processo está na 7ª Vara Cível de Duque de Caxias.

“Fiquei horrível, com uma cicatriz horrorosa, além de ter tido problemas nos pontos, que abriram e não paravam de sair líquido. Foi um dinheiro jogado fora. Sonhava em ostentar um decote e, hoje, ando mais tapada do que antes da cirurgia. Tenho vergonha.”

Fernanda só soube que Kellen não era médica depois.

“Todo mundo a tratava como médica na Santa Branca, ela só vivia em consultório e se apresentava assim nas redes sociais também. Vivia postando foto em consultório e no centro cirúrgico”, diz Fernanda com imagens que também integram o seu processo.

Imagens que Kellen Queiroz teria postado em suas redes sociais — Foto: Reprodução

Polícia investiga

Ao chegar no Hospital Santa Branca para prender Bolívar no caso da paciente que estaria em suposto cárcere privado, policiais da Delegacia da Mulher, de Duque de Caxias, encontraram Kellen Queiroz dentro do centro cirúrgico com o médico.

Indagada se era médica, negou, disse que era estudante de medicina na UNIG, mas estava com a matrícula trancada e que era técnica de enfermagem. Pontuou ainda não atuava assim no Santa Branca.

Trecho do depoimento de Kellen para a polícia — Foto: Reprodução

Trecho do depoimento de Kellen para a polícia — Foto: Reprodução

O g1 entrou em contato com a delegada Fernanda Fernandes, da Deam de Caxias, para saber se ela investiga Kellen e se tem ciência de que ela operava.

“Estamos na fase de apuração do inquérito policial. Tudo está muito recente, mas estamos analisando todos os depoimentos, todas as evidências e, se constatados outros crimes, vamos investigar e indiciar”, disse a delegada.

Kellen e Bolívar: ‘Sempre um prazer operar ao seu lado’ — Foto: Reprodução

A pena para quem exerce a profissão de médico ilegalmente varia de seis meses a dois anos de prisão. Se o crime é praticado com o fim de lucro, aplica-se também multa.

A prisão do médico

Bolívar Guerrero Silva foi preso no dia 18 de julho quando estava dentro do centro cirúrgico do Hospital Santa Branca, em Duque de Caxias. Segundo a polícia, ele mantinha uma mulher em cárcere privado depois que ela teve complicações depois de uma cirurgia de abdominoplastia e está em estado grave.

A mulher, de nome Daiana Cavalcanti vinha tentando ser transferida de hospital, mas o cirurgião dificultou a transferência, mesmo com duas liminares da Justiça.

Daiana estava internada desde junho desse ano no Hospital Santa Branca, e foi transferida na manhã da quinta-feira (21) para o Hospital Geral de Bonsucesso, na Zona Norte do Rio.

Bolívar responde a pelo menos 19 processos na Justiça por erros médicos e teve sua prisão temporária mantida pela Justiça após audiência de custódia.

Após a divulgação do caso de Daiana, pelo menos 20 mulheres já compareceram à Delegacia da Mulher de Duque de Caxias para denunciar o médico. Em um dos casos, familiares de um jovem foram ao local denunciar que suspeitam que a familiar tenha morrido por erro médico após um procedimento, mas teve a morte atestada como complicações por Covid.

Fonte: G1 com Nortão MT

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